Explorando a Riqueza da Gastronomia
Cearense sob o Olhar do Chef Marcos Lôbo
Publicado em
23/09/2023 às 21h59,
Neste espaço, desejo compartilhar com vocês a minha
emocionante jornada pelas terras do Ceará, que se iniciou por volta de 1964.
Foi uma viagem que me conduziu ao coração da culinária cearense, onde pratos
emblemáticos como o baião de dois, carne de porco assada, sarapatel, miúdos de
boi, peixada, caldeirada e muitos outros se tornaram pilares fundamentais do
meu aprendizado ao longo da minha carreira como chef. Hoje, convido vocês a
adentrarem na cozinha de Dona Ivanise Lôbo, compartilhando detalhes que
permaneceram gravados na memória de um jovem apaixonado por gastronomia desde a
mais tenra idade.
Agricultura
e seu Papel Crucial na Culinária
A agricultura sempre desempenhou um papel essencial em minha
vida cotidiana. Durante meus estudos, ao explorar as civilizações humanas,
compreendi que a agricultura foi a base que permitiu a existência de nossa
espécie. Essa lição ressoou profundamente em mim, e minha jornada no Ceará não
fez senão reforçar essa ideia.
O Baião de
Dois e a Carne de Porco Assada
Desde o início desta jornada, o Baião de dois e a carne de
porco assada marcaram presença de maneira imponente, graças à forma como minha
mãe os preparava. O feijão, de coloração marrom característica da região, era
cozido na panela de pressão por 15 minutos, junto com folhas de louro, alho,
cebola, sal e óleo. Após esse processo, adicionava-se o arroz à mesma panela
por mais 5 minutos, resultando em um prato que só era destampado na hora de
servir. A carne de porco, por sua vez, era marinada no vinho d'alho um dia
antes do preparo. No dia de servir, cada pedaço era temperado com alho, cebola,
tomate, cheiro verde e um mix de temperos secos (pimenta do reino, folha de
louro, cominho triturado), acrescido de vinagre e sal. Na hora do cozimento, a
base de gordura e cebola era adicionada antes de colocar a carne, que podia ser
apreciada cozida ou frita na própria gordura, ambas opções deliciosas.
A Polémica
do Sarapatel
O sarapatel sempre gerava polémica em nossa casa, pois
metade dos familiares o apreciava, enquanto a outra metade não compartilhava do
mesmo gosto. A base do vinho d'alho era essencial para temperar as carnes, e
antes de utilizá-lo, os miúdos de boi, incluindo fígado, bofe, líbro, tripas
grossas, tripas finas, coração e rins, passavam por um processo de escaldamento
com casca de cebola, casca de alho, folha de louro e vinagre, seguido de
cozimento por 15 minutos. Após escorrer, esses miúdos eram temperados com alho,
cebola, tomate, cheiro verde e o já conhecido mix de temperos secos. Quiabo em
rodelas e jerimum em cubos médios eram adicionados durante o cozimento, e a
iguaria era servida com arroz e farofa. Em minha versão desse prato,
acrescentei a páprica defumada, conferindo-lhe um sabor único.
Um Olhar
Transformador na Culinária Cearense
A jornada pela gastronomia cearense foi uma descoberta
reveladora para mim e uma parte fundamental do meu aprendizado. Cada
ingrediente e sua preparação cuidadosa foram moldando minha perspectiva e me
transformando em um chef que não apenas cozinha, mas pesquisa e investiga cada
sabor. Tudo isso se entrelaçou com as memórias e técnicas da minha genitora,
que preparava essas delícias diariamente.
Ingredientes
da Terra e do Mar
Nossa mesa era enriquecida por produtos da caça e da pesca,
como preá, pato selvagem, pombo, coelho e outros, além de uma variedade de
frutos do mar, incluindo siri, caranguejo, guaiamum, cioba, pargo, polvo,
camarão, marisco, sururu, mexilhão e ostra.
A Peixada
Tradicional de Minha Genitora
Por fim, não poderia deixar de mencionar a peixada
tradicional de minha mãe, que consistia em temperar o peixe apenas com sal e
limão, regado com azeite. Após deixar marinar na geladeira por duas horas, as
postas eram fritas em óleo quente. Em uma panela à parte, minha mãe preparava
um refogado com azeite, cebola, pimentão, tomate e pimenta de cheiro,
adicionando as postas e regando-as com leite de coco e dendê. Por último,
coentro era acrescentado, e o prato era abafado por 5 minutos antes de ser
servido, acompanhado de pirão e arroz branco.
A culinária cearense é uma fonte inesgotável de histórias e
sabores, e estou entusiasmado em compartilhar mais dessas experiências com
todos vocês.
Pesquisador / Gastrônomo
Pernambuco - Brasil
WhatsApp: (81) 997886975
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